Walter Lewy
O sonhador e a sublime criação do mundo
WALTER LEWY
O Surrealismo de Walter Lewy e a história da Galeria Frente
Neste ano, celebramos mundialmente o centenário do surrealismo nas artes visuais. O movimento artístico e literário surgido na Europa teve grande impacto cultural, pois valorizava a intuição e a criação, e acreditava que o subconsciente era fonte inesgotável de criatividade e liberdade. O poeta francês Guillaume Apollinaire (1880-1918) criou a expressão “surrealismo” em 1917, mas o manifesto surrealista foi lançado oficialmente em Paris, em 1924, pelos franceses André Breton (1986-1966), Yvan Goll (1891-1950) e Marcel Alland (1899-1986).
O movimento surrealista chegou ao Brasil por volta de 1930, durante o movimento modernista, e podemos reconhecer sua influência nas obras de Tarsila do Amaral (1886-1973), Cícero Dias (1907-2003) e Ismael Nery (1900-1934). Mas foi somente em Walter Lewy (1905-1995) que ele encontrou plena realização. A trajetória do artista alemão nascido em Bad Oldesloe foi marcada pelos horrores da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). De origem judaica e com formação erudita na Escola de Artes e Ofícios de Dortmund, entre 1923 e 1927, ele se viu obrigado a fugir dos delírios nazistas em sua terra natal.
Para escapar dessa situação opressora, o artista imigrou para o Brasil em 1938, aos 33 anos, onde retomou profissionalmente a pintura. Deixou para trás centenas de trabalhos, perdidos durante os bombardeios do temível confronto. No Brasil, fixou-se na cidade de São Paulo. Nos primeiros anos, fez desenho publicitário e mais tarde capas de livros e desenhos para diversas editoras. Ilustrou obras do filósofo galês Bertrand Russell (1872-1970), do escritor brasileiro Machado de Assis (1839-1908) e do historiador britânico Arnold J. Toynbee (1889-1975), entre outras.
Lewy marcou presença ativamente do cenário cultural da época, tendo participado das primeiras Bienais de São Paulo: 1° Bienal em 1951; 2° Bienal em 1953; 3° Bienal em 1955; 6° Bienal em 1961; 8° Bienal: Sala Especial Surrealismo e Arte Fantástica em 1965; 13° Bienal em 1975; e na mostra Tradição e Ruptura: síntese de arte e cultura brasileiras, em 1985. Também integrou várias edições do Salão Paulista de Arte Moderna, além de inúmeros Panorama de Arte Atual Brasileira, realizado pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo. Seu currículo extenso de exposições conferiu ao artista imigrante amplo reconhecimento de seu trabalho e prestígio entre importantes atores e agentes culturais do sistema das artes visuais no Brasil, que ainda estava em seu estágio inicial.
Infelizmente, a obra e o legado estético de Walter Lewy ficaram restritos a poucos: o tempo foi tornando sutil uma história importante e única. Ele não se aproximou do surrealismo como uma ideia vinda de fora: ele já vivia o movimento na terra natal. E firmou-se nos trópicos como grande artista visual, expondo uma estética singular e mágica, repleta de repertório semântico.
Desde a sua inauguração, o objetivo da Galeria Frente é ressaltar o trabalho de grandes artistas brasileiros e mostrar obras históricas por meio de exposições retrospectivas, individuais e coletivas. Conhecida pelo seu programa expositivo, já exibiu as trajetórias dos artistas Mira Schendel (2015); Antonio Maluf e Hércules Barsotti (2016); Frans Krajcberg (2017); Iberê Camargo e Francisco Stockinger (2018); Gilberto Salvador (2021); Igor Rodrigues (2022); Candido Portinari (2023); e A Realidade Máxima das Coisas (2024).
Estamos trazendo para o contemporâneo a obra de Walter Lewy porque acreditamos que existem novos olhares e formas de ler o seu trabalho pelo prisma mais amplo. Sabemos também que esse artista merece o reconhecimento que já teve e está na hora de voltar a ter. Além de ceder o nosso espaço, não posso deixar de citar e agradecer a colaboração primorosa de toda a equipe e a atuação valorosa, cuidadosa, precisa e dedicada do crítico e curador Jacob Klintowitz, que embarcou conosco em mais esse projeto.
Outra iniciativa inédita é a materialização da exposição no livro que a acompanha. Há muitos anos não temos mais nenhuma nova percepção sobre a obra de Walter Lewy. Klintowitz expõe - com toda a sensibilidade que lhe é inerente - um olhar sublime de entrada nesse universo de sonho e criação.
Outro ponto único e inédito é a parceria com os colecionadores Claude Martin Vaskou e Eliana Minillo, detentores da coleção que ora estamos apresentando. Movidos pelo desejo imenso de deixar viva e acesa a chama do legado estético do artista, e dotados de paixão, cuidado e carinho, foram fundamentais em todo o desdobramento do projeto, da concepção até a plena realização. A eles, nosso muito obrigado.
Conheço Claude há mais de 20 anos: é amigo pessoal e me ajudou no início da minha carreira. Então, para mim, é uma satisfação pessoal e profissional colaborar com essa proposta artística. E também a possibilidade de retribuir com gratidão a essa amizade.
Sinto-me feliz em dar acesso, apresentar para uma nova geração e tornar visível para os colecionadores atentos que conhecem uma boa obra de arte a exposição Walter Lewy: O sonhador e a sublime criação do mundo, certo de que teremos mais esse grande sucesso em nossa trajetória.
Boa exposição e leitura!
James Acacio Lisboa, diretor
Jacob Klintowitz, curador